Blogue do Maia de Carvalho

POR TRÁS DE CADA GRANDE FORTUNA HÁ UM CRIME. Honoré de Balzac

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Uma Questão de Bom-senso



Não se intitula doutor, nem professor, nem especialista em qualquer das ciências sociais mas aparece como paladino do bom senso a dizer-nos o que já suspeitávamos mas não éramos capazes de exprimir.

Não é toda a explicação do problema mas está, nesta carta de desabafo de um leitor do “Público”, uma das principais causas do insucesso e abandono escolar no nosso país. Era sobre estes casos de Educação Pública, que o Governo se devia interessar. Se a matéria-prima que se manda para as escolas é, e eu sei que a maior parte das vezes é, esta, retratada por este leitor do “Público, então, por mais Regulamentações de Carreiras Docentes que se façam, não há Instrução em Portugal, nem uma sociedade civil organizada política, económica e culturalmente.

Companhias indesejáveis

Caro pai de uma ou mais criancinhas,

Então você ouviu dizer que as criancinhas são "a coisa mais importante do mundo" e acreditou logo à primeira? E você nem sequer quis saber que esse boato só começou em 1945, depois de acabar a Segunda Grande Guerra? E também não quis saber que, antes disso, a importância dada às criancinhas era sobretudo na esperança de que crescessem saudáveis, para terem força, afim de poderem ajudar os pais nos trabalhos físicos? Ou será que você ainda não reparou que a única capacidade da juventude, superior às capacidades dos adultos, é apenas o vigor físico?

Não me diga que você nem sequer sabe que o boato sobre a importância das criancinhas foi lançado porque havia falta de gente na Europa, por terem morrido milhões de pessoas, durante a última guerra. E que esse boato foi lançado para convencer os paizinhos a fazerem muitos meninos, porque estes eram precisos para trabalhar no desenvolvimento dos respectivos países.

Mas você, pelos vistos, percebeu tudo ao contrário ou não percebeu mesmo nada e, em vez de se pôr a fazer meninos de empreitada, fez apenas um, só para mostrar que tinha sido capaz. E depois, espantado e cheio de vaidade por este seu sucesso, talvez por ser, quem sabe, o primeiro da sua vida, vá de fazer da criancinha o emblema do seu sucesso, e toca de gastar o que tem e o que não tem, só para mostrar, aos vizinhos e ao mundo, que você é um homem bem sucedido na vida.

Para além de artilhar a criancinha com roupas e adornos que fazem dela uma tentação ambulante para os delinquentes, você até comprou um automóvel, ou comprou mais outro automóvel, para mostrar que leva a criancinha, de automóvel, à escola.

E não satisfeito com estes disparates todos, você tornou-se dependente da presença da criancinha, para melhorar a sua imagem social de sucesso, com que pretende enganar o público.

Por isso mesmo, você passou a levar a criancinha para tudo o que é sítio. É para os hiper-mercados, é para os centros comerciais, é para os restaurantes, é para as viagens de carro, de barco ou de avião.

E com essa necessidade de andar sempre a mostrar-se, atrelado à criancinha, esqueceu-se, ou não lhe apeteceu, passar mais tempo com ela, em casa, a transmitir-lhe valores e princípios éticos, morais e cívicos e a ensinar-lhe boas maneiras como, por exemplo, não dar gritos, nem guinchos, nem fazer birras, nem pôr os pés em cima das cadeiras e dos assentos dos transportes públicos.

E por causa do seu absentismo e da sua incompetência paternais, sempre que eu vou comer a um restaurante ou fazer uma qualquer viagem e tenho o azar de lá aparecerem, também, você e a sua criancinha, tenho que gramar berros, correrias, gritos e encontrões.

Por isso desengane-se. Se pensa que está a botar figura de homem bem sucedido na vida, por levar a sua criancinha aos restaurantes ou em viagens de avião, está redondamente enganado. Eu e os outros adultos que temos o azar de estarmos também nesses lugares, apenas ficamos a saber que a sua criancinha está mal-educada e que você, pelo menos como pai, não presta.

Pior do que isso: ao dar tudo à sua criancinha, sem que ela tivesse feito algo, bem feito, para merecer todas essas regalias, você é o principal responsável pela criação de mais um jovem que não irá sentir quaisquer incentivos para gostar de trabalhar e de ser independente.

Se acha que não tenho razão, então tente fazer outra criancinha, mas desta vez veja se consegue que ela nasça já com um telemóvel e um canudo de licenciada em ignorância, que é o que está a dar agora, e depois... depois vote num partido que lhe prometa arranjar empregos duradouros para as suas importantes criancinhas, mesmo que elas não queiram, nem saibam, fazer nada.

Pronto! Já desabafei. O resto é consigo.

VITOR MANUEL ALVES – LISBOA
«”PÚBLICO” 14 de Dezembro de 2006»

5 Comments:

At 9:04 da tarde, Blogger João Melo Alvim said...

Impossível não deixar de concordar.

 
At 10:32 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Muito bem visto.

 
At 10:33 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Muito bem visto.

 
At 12:57 da tarde, Anonymous Anónimo said...

lolololol

 
At 10:20 da tarde, Blogger Bxana said...

Estou a ler este texto pela primeira vez e só me apetece bater palmas!

E agora com a época do natal, em que tantos papás enchem as criancinhas de brinquedos famosos, cujos anuncios passam incessantemente na tv, sem se preocuparem minimamente com as reais necessidades educativas dos meninos?

...

 

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