Blogue do Maia de Carvalho

POR TRÁS DE CADA GRANDE FORTUNA HÁ UM CRIME. Honoré de Balzac

sexta-feira, janeiro 19, 2007

«O Anjo Mudo»







Acabei de ler este livro do Prémio Nobel de 1972, Heinrich Böll.

Saturados de propaganda, anestesiados por mil e uma imagens de bandeiras, tanques, aviões, obuses e caras de facínoras importantes, de um lado e outro da barricada, esquecemo-nos de que os alemães, mesmo integrados na ordem nazi, eram pessoas. É preciso ler livros como “O Anjo Mudo” com um tempo de acção bastante curto (a narração começa no dia do armistício, 8 de Maio e dura até fins de Junho do mesmo ano), para nos apercebermos disso, do medo, do cansaço, da fome física e de afectos e amor, que como homens, partilham connosco.

Agrada-me imenso que, desde 1948 e durante três ou quatro anos, tenha tido como colega e amigo de liceu, um menino alemão, vindo para Portugal ainda durante a Guerra. Carl Adolf, de seu nome, perdeu-se depois do meu convívio, como acontece sempre a tantas pessoas que se cruzam connosco nos meandros da vida. Em 1995, por acaso, encontrei-o quando em Coimbra ele se encontrava em serviço de uma qualquer missão europeia, como consultor económico de um grande grupo empresarial. Grande contentamento o nosso, que recordações de brincadeiras e partidas que pregámos nesses tempos de meninice!

As voltas que o Mundo dá!

«Na manhã seguinte não havia nada na cozinha, mas ele encontrou um bilhete: «Não tenho mais nada; talvez hoje à noite». Esperou por ela na cozinha, deitou-se entretanto na cama, dormiu um pouco e acordou quando ela chegou; era só meio-dia.

Ele foi à cozinha, encontrou-a cansada, sentada numa cadeira com um cigarro na mão; havia pão em cima da mesa.

Ela riu-se ao vê-lo de repente parado na sua frente. «Oh», disse, «a fome faz-te ressuscitar...»

«Desculpa», disse então suavemente, «vem, come, por favor.» Ele sentiu-se corar, e olhou-a com atenção: o seu rosto pálido não denotava sarcasmo, pareceu-lhe ligeiramente corado, e, pela primeira vez, sentiu vontade de a beijar.»
«O ANJO MUDO
Heinrich Böll »

Imagens do livro:
«As Grandes Batalhas Terrestres da II Guerra Mundial»
Editora Ulisseia, Lisboa, 1975,

8 Comments:

At 9:20 da manhã, Blogger Teresa said...

Caro Professor,

Fiquei cheia de vontade de ler O Anjo Mudo, a sua recomendação é mais do que convincente. Assim que tiver um bocadinho vou comprar o livro (vivo num raio dum sítio onde até para ir à mercearia tenho de pegar no carro). A II Guerra Mundial sempre exerceu em mim um enorme fascínio (acho que herdado do meu Pai e agravado pelo magnífico documentário da BBC O Mundo em Guerra, que ainda tenho em vídeo e urge comprar em dvd. Ainda não concretizei a coisa porque é um bocado carote, mas está disponível na Amazon).
Um dia hei-de ir a Aushwitz, to come full circle (seria uma longa história). Visitei Dachau há três anos. Acredita que não consegui tirar uma fotografia? Pareceu-me que de alguma maneira seria uma profanação do local e das memórias do que ali aconteceu. Estive lá na pior época do ano, em Fevereiro,o campo estava coberto de neve. Completamente protegida por roupa muito quente, cheia de luvas, cachecóis e tudo o resto, não conseguia deixar de lembrar que 60 anos antes aquele frio terrível era enfrentado com um fato de algodão grosseiro e um cobertor (quando havia, e às vezes dividido por vários). Recomendo-lhe duas coisas. Um livro: A Centelha da Vida, Erich-Maria Remarque. Aposto que já leu. Um dvd. Anne Frank Remembered, documentário de quase duas horas que teve honras merecidas de Oscar. Está disponível na Amazon.

Agradeço a visita que fez ao blóguio do querido e velho Liceu e deixo-lhe aqui (para o caso de não voltar lá, o que muito nos entristeceria) cópia da minha resposta ao seu post tão simpático:

Caro Professor,

Na qualidade de anfitriã deste espaço, dou-lhe as boas-vindas a este nosso cantinho. É um pedacinho mais velho do que nós, mas isso não importa nada. O que importa verdadeiramente é que andou no nosso Liceu, e como tal é cá dos nossos. Conte-me tudo, não me oculte nada... também foi aluno do Vergílio Ferreira?

Não sei como chegou aqui, mas é bem-vindo. Não sei o que leu deste blóguio (feliz expressão do António que cá por estas bandas já é marca registada). Recomendo-lhe que dê uma espreitadela ao post de 25 de Novembro passado. Esteve lá? Foi aluno da Dr.ª Marina Pestana?

Conte-nos coisas de si e participe, que este blóguio, desde que o Manel anda amuado e o Antóno anda por aí aos tirinhos (isto para não falar na Mariana, que deve andar a viver um tórrido romance, abençoada seja) precisa mesmo de ser revigorado. E deixe-nos o endereço do seu blóguio, para que possamos (póssamos, private joke) visitá-lo. E olhe que contamos consigo no dia 16 de Junho! O Manel já tem uns prémios giríssimos para as rifas. Eu vou finalmente ver-me livre daquele coiso que um amigo cujo nome não posso dizer me deu há largos anos como sendo uma saladeira e que uso como alguidar para pôr a lingerie La Perla de molho.

ABRAÇOO!!

 
At 10:35 da manhã, Blogger Afectos said...

Mercredi. Televisão francesa. Filmes temáticos. Sobre a segunda guerra mundial vi coisas que nunca vou esquecer. Sobre a guerra nunca li nada a não ser o diário de Anne Frank.

 
At 12:08 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Professor Maia de Carvalho, sou jornalista d'O Correio de Pombal e gostaria de entrar em contacto consigo. Não consegui encontrar aqui nenhum endereço de mail para o poder contactar de outra forma e, por isso, peço desculpa por o fazer desta maneira. Se puder, envie-me um e-mail para o endereço nunotoliveira@hotmail.com e sugira a melhor forma de o poder contactar.
Obrigado

 
At 2:48 da tarde, Blogger João Melo Alvim said...

Duas notas

A partir da sua sugestão (que irei seguir), recomendo "Despojos de Berlim" de Michael Pye (Asa), uma interessante história sobre um rapaz que passou a sua infância em Berlim no fim da guerra com a sua mãe, contada em flashbacks, partindo do esforço do menino já homem, nos nossos dias, para enfrentar o passado da mãe durante a queda do Reich. É outra perspectiva do alemão anónimo.

Recomendo também "História de um Alemão" de Sebastian Haffner (D.Quixote), que conta a infância e adolescência de um jovem desde o fim da 1ª Guerra Mundial até à ascensão do III Reich (1933), sempre na perspectiva do cidadão comum que não gostava do que via, mas acabava, por omissão, em participar.

Por último, referência a mais uma referência (passe o pleonasmo) num jornal cá da terra, sinal de que a blogosfera em Pombal, sem querer roubar lugar a ninguém, tem por onde se impôr.

Abraço

 
At 6:28 da tarde, Blogger Teresa said...

Ainda sobre a II Guerra Mundial:

Alguém leu A Ponte (Manfred Gregor, Europa-América)? Lembro-me de o ter devorado lá pelos meus 14 anos - há imenso tempo - e de me ter impressionado imenso. Não sei se uma releitura lhe manteria o estatuto.

Também não tenciono revisitar o Uma Noite em Lisboa ou o Arco do Triunfo do Remarque, são memórias de adolescência, prefiro não mexer nelas, poderia ter alguma decepção.

As minhas re-visitas seguras e de re-encantamento garantido são outras. O Eça. Pessoa (Álvaro de Campos e Alberto Caeiro). Oscar Wilde (fui de propósito a Paris no centenário da morte dele, estava no Père Lachaise às 13:50, hora oficial da morte, só não fiquei no hotel porque estava em obras, mas como sou uma mula teimosa ainda arranjei maneira de lá ir beber uma flûte de champagne). Proust. Quino. Sim, o da banda desenhada. Quase todos os dias me aparecem situações que me dão azo a citá-lo, o homem é um génio. O Goscinny também era, já agora.

P.S. Professor, peço muita desculpa pela invasão abusiva deste seu blóguio.

 
At 7:28 da tarde, Blogger susana said...

Não percebi aquilo do mail??? Explica-me melhor!!!
Quanto ao post, parece interessante esse livro, pode ser que um dia ainda o leia!
Já sabia que ías recuar quanto ao tema no meu blog. Sei que és contra!Podias tê-lo dito, estamos num país livre(ou será que não estamos???)
beijinhos....vai lá explicar melhor, isso do mail

 
At 4:02 da tarde, Blogger Teresa said...

Caro Professor,

Continuarei a ser cerimoniosa consigo neste espaço em que é anfitrião. O nome próprio e o tratamento por tu ficam reservados para o nosso cantinho camoniano.

Esperamos poder contar com a sua visita de futuro. Bem sei que somos um bando de gente tonta - se espreitou o blóguio não estou a dar-lhe qualquer novidade -, mas continuamos profundamente amigos e com uma lealdade feoz ao Liceu - que eu escrevo sempre com maiúscula. Como Pai e Mãe.

Reparará que adicionei o seu endereço aos links de blóguios amigos (ou, pelo menos, não hostis...). Idem para a divertidíssima Diabba, cujo blóguio já me fez rir a bom rir. Só é pena que não tenha andado no Liceu e nos tenha chamado kotas... Uma pessoa sente-se, que diabo!

Relativamente ao Camoniano que nos recomendou (li o seu tão simpático post), gostaríamos de que nos desse um ar de sua graça, que ainda não se abalançou (palavras dele).

BATATAA!

P.S. Acrescente-nos aos seus favoritos: As Tágides e os Adamastores

 
At 4:17 da tarde, Blogger Teresa said...

Peço desculpa, sou mesmo naba!

Rectifico a mão: As Tágides e os Adamastores

BATATAA!

 

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