Blogue do Maia de Carvalho

POR TRÁS DE CADA GRANDE FORTUNA HÁ UM CRIME. Honoré de Balzac

sexta-feira, outubro 24, 2008

Violência e Agressão

“O homem não é de modo nenhum a coroa da criação: ao lado dele, cada ser se encontra com o mesmo grau de perfeição… E, ao pretender que assim é, vamos ainda mais longe: o homem é, relativamente, o mais falhado de todos os animais, o mais desajeitado, aquele que mais perigosamente se afastou para longe dos seus instintos…”

«Friedrich Nietzsche»

Imagem de:

http://medicosdeportugal.saude.sapo.pt/action/2/cnt_id/741/


Quando se fala de violência e agressão há uma relação directa entre um termo e outro, como se a violência fosse a agressão em potência e a agressão a violência em acto. Mas o que fundamenta realmente a violência/agressão?

“Entretanto, Caim disse a Abel, seu irmão: - Vamos ao campo. - Porém logo que chegaram ao campo, Caim lançou-se sobre o irmão e matou-o.” Gn.4, 8.

Este é segundo as religiões abraâmicas, (Judaísmo, Cristianismo, Islamismo) a primeira referência explícita à violência humana. Mas, nestas sociedades bíblicas, a humanidade já havia estabelecido diferenciações sociais. Havia pastores e agricultores – as bases económicas – e também guerreiros, comerciantes, sacerdotes e chefes. Aquela citação bíblica é apenas a ilustração da forma mitológica como, à falta de outra mais esclarecedora, os primitivos tentavam explicitar e explicar qualquer coisa que existia desde sempre e que ocasionalmente, mas com frequência, saía fora do controlo social: o mal, a guerra, o homicídio, a agressão.

Depois de Darwin, evidenciou-se que a competição inter específica era essencial para a selecção e evolução das espécies. Mais modernamente Konrad Lorenz, darwinista convicto, veio explicar-nos melhor como tal instinto agressivo se manifesta e porquê.

Para ele a agressão é um instinto como os outros e radica na necessidade de defesa de um território individual ou do grupo que possuímos tal como outros animais, principalmente os do grupo a que pertencemos: os primatas. Em estado natural, no início da hominização, raramente a agressão resultava em morte de algum dos contendores, havia espaço e era sempre fácil o mais fraco dar-se por vencido e procurar outro território.

Os zoólogos sabem que a agressividade dos animais territoriais é tanto mais intensa quanto mais próximo do centro territorial o animal ou o grupo se encontram. Na periferia a agressividade dilui-se. É apenas por esta razão que, para às forças policiais, é tão difícil penetrar até ao coração dos bairros problemáticos como a Cova da Moura, em Lisboa, ou o Aleixo, no Porto.

A civilização ao tornar-se quase exclusivamente urbana, com as cidades a crescerem desmesuradamente, tornou-se a principal causa do aumento proporcional da violência e da agressão. O homem é um animal territorial (colocação de marcos intocáveis nas propriedades agrícolas; decoração sui generis de cada habitação e colocação do nome do proprietário ou da família em local bem visível, indicação explicita de “ATENÇÃO, PROPRIEDADE PRIVADA”, algumas vezes substituída por um outro aviso “CUIDADO COM O CÃO”, o arranjo das secretárias nos locais de trabalho, muitas vezes com objectos pessoais ou até fotos do cônjuge ou do filho ou filhos, a procura preferencial pelo mesmo lugar no café ou nos transportes públicos) como Desmond Morris, muito bem, faz notar nas suas obras.

Resumindo, a domesticação do homem, realizada pela urbanização, distribuindo-o por jaulas sobrepostas, retirou-lhe qualquer coisa tão vital como se o privassem de alimento ou de oportunidades para se reproduzir. Dai o recrudescimento da agressão como forma de marcar territórios virtuais, criados artificialmente, e a organização de bandos, principalmente de machos jovens, (ultimamente algumas fêmeas também participam) para a sua defesa.

Se não modificarmos a dimensão das cidades e a organização dos seus bairros em guetos, o problema não tem solução. É só esperarmos que, pelo menos, os mais fortes sobrevivam!

Publicado em “O Correio de Pombal” de 23 de Outubro de 2008.



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